Com pandemia, brasileiros avaliam benefício de ano extra até Tóquio
Mundo – Em condições normais, a Olimpíada de Tóquio começaria nesta sexta-feira (24). O mundo esportivo não contava, porém, com a pandemia do novo coronavírus (covid-19), que forçou a mudança dos Jogos para 2021. Ou seja, a partir desta quinta-feira (23) recomeça a contagem regressiva de exatamente um ano para o evento na capital japonesa.
O impacto do adiamento foi sentido de maneira diferente por atletas e técnicos. Há quem estivesse no melhor das formas física e técnica e tenha lamentado por precisar rever o planejamento de 2021. Já outros ganharam, por assim dizer, mais um ano para chegarem 100% em Tóquio. A surfista Silvana Lima está nesse segundo grupo.
“Em 2018 fiz uma cirurgia nos dois joelhos, então 2019 foi um ano muito puxado. Foi minha quarta cirurgia. Corri contra o tempo para me classificar para a Olimpíada. Para o meu lado, achei muito bom [o adiamento]. Esse ano seria muito corrido para chegar 100% nos Jogos”, afirmou a surfista duas vezes vice-campeã mundial à Agência Brasil.
O surfe é uma das modalidades que estrearão em Tóquio. É também a única debutante com brasileiros garantidos até agora. Além de Silvana, também se classificaram Tatiana Weston-Webb, Ítalo Ferreira e Gabriel Medina. O caratê tinha Vinícius Figueira assegurado antes do adiamento dos Jogos, devido ao cancelamento das etapas que antecediam o evento no Japão – ele até chegou a ter a vaga oficializada pela Federação Internacional de Caratê (WKF, na sigla em inglês). Mas a entidade alterou o sistema qualificatório após a mudança de data da Olimpíada, frustrando Vinícius.
No judô, esporte que mais rendeu medalhas olímpicas ao Brasil (22), o sentimento também é de que a mudança dos Jogos para 2021 foi mais positiva do que negativa. Gestor de Alto Rendimento da Confederação Brasileira da modalidade (CBJ), Ney Wilson avalia que o novo prazo pode colaborar com o amadurecimento dos atletas, principalmente entre os homens. Se o período de classificação olímpica terminasse agora, a equipe masculina teria cinco judocas estreantes em Olimpíada.
“Acho que, em um ano, conseguimos classificar a categoria até 73 quilos (masculina) sem depender de uma cota continental e colocar mais atletas entre os cabeças de chave. Claro, há atletas que estavam chegando muito próximo do ideal e tiveram que se replanejar, mas nada que não tome rumo”, disse Wilson,há um mês à Agência Brasil. Ele reforçou, porém, a importância de se voltar aos treinos e aproveitar, ao máximo, esse tempo a mais de preparação.
Essa preocupação tem a ver com o impacto da pandemia, já que poucos atletas, não somente do judô, vêm conseguindo realizar atividades com intensidade devido às restrições de acesso às estruturas esportivas. A Confederação Brasileira de Atletismo (CBAt), por exemplo, teve de esperar quatro meses para reabrir o Centro Nacional de Desenvolvimento da modalidade (CNDA), com limitações de horário e circulação de pessoas, após autorização da prefeitura de Bragança Paulista (SP). Onze dias depois, o local precisou ser fechado por decisão do Tribunal de Justiça de São Paulo.
O skate, outro estreante olímpico, é mais um esporte em que boa parte dos atletas ainda não pôde retornar aos treinos de vez. A Confederação Brasileira da modalidade (CBSk) promove um plano de retomada gradual com os 22 integrantes da seleção nacional. “O skate tem questões pessoais de cada um. Alguns têm pista particular à disposição, outros não. Estamos trabalhando, levando em conta, claro, as condições físicas de cada um, mas, principalmente, as características de onde moram, qual pista pode e qual não pode”, descreveu Eduardo Musa, presidente da entidade.
Na entrevista à Agência Brasil, no último dia 10 de julho, Musa avaliou que, por ora, não vê prejuízo técnico para o skate, projetando 2021. “Entendemos que vai ter tempo sim para se recuperar, e que chega forte do mesmo jeito à Olimpíada. Dito isso, claro que, quanto mais tempo demorar [a volta aos treinos], a apreensão pode voltar a acontecer”, declarou.
Já em países atingidos pela pandemia antes do Brasil, como os europeus, os treinos puderam ser retomados no início de maio. “Começamos a viabilizar algum local para receber nossos atletas e tomar medidas para que a preparação não fosse impactada”, explicou o vice-presidente do Comitê Olímpico do Brasil (COB), Marco La Porta, em entrevista ao repórter Igor Santos, da TV Brasil.
A saída encontrada pela entidade foi a Missão Europa. A ideia é ajudar a retomada da preparação de atletas já garantidos ou com chances de vaga em Tóquio, levando-os para treinar em Portugal, onde a situação da covid-19 está mais controlada. A primeira leva, com 76 esportistas, além de técnicos e equipes multidisciplinares, viajou na última sexta-feira (17). A previsão do COB é que mais de 200 atletas, de 16 modalidades, participem da iniciativa (que tem custo estimado de R$ 13,4 milhões) até dezembro.
Algumas confederações, como a de skate, aguardam a definição dos calendários internacionais de 2020 para integrar a Missão, o que, aliás, é outra consequência da covid-19. Muitas federações ainda negociam com entidades nacionais das respectivas modalidades o retorno às disputas. No cenário interno, não é diferente. “Vai ser muito difícil termos uma retomada de competições no Brasil neste ano. Dependerá muito da situação de cada local. Nosso país é heterogêneo. Há locais onde a pandemia está mais controlada, outros não”, reconheceu La Porta.
É um cenário que impacta diretamente, por exemplo, Silvana Lima. A surfista pode só voltar a competir em 2021, já que a temporada do QS (qualificatório à elite do circuito mundial da modalidade) foi cancelada e, segundo ela, ainda não há confirmação da realização do campeonato brasileiro. “O negócio agora é treinar. Tenho uma experiência grande em competição. Acho que a única coisa que tenho de consertar é a forma de começar as baterias. É nisso que eu e meu técnico estamos trabalhando para chegar em Tóquio e dar o melhor”, concluiu.
***Com informações da Agência Brasil